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Chocante, não é?
Como é que nós, que vivemos a nossa vida tranquila na União Europeia, temos alguma culpa na carnificina que ocorre agora diariamente em Moçambique?
Analisemos.
Cabo Delgado era o paraíso, certo? O local para onde íamos de férias comer o belo camarão-tigre a preços irrisórios e apreciar a natureza no seu estado mais selvagem e intocado.
O que nunca pensámos, porque nunca pensamos habitualmente quando estamos de férias num país sub-desenvolvido cuja população vive maioritariamente abaixo do limiar da pobreza, é qual é o nível de vida dos locais que nos servem esse belo camarão tigre.
Moçambique é um país em vias de desenvolvimento. E o que é que isso significa, na verdade? Não, não significa só grande dependência de combustíveis fósseis. Significa gente a viver em barracas de madeira e a viver com menos de um dólar por dia. Significa grande investimento em construção e pouco investimento em recursos humanos. Significa, com sorte e com líderes competentes, que partes do país se tornarão mais industrializadas e "civilizadas", mas que outras partes continuarão ainda na miséria para alimentar essas mesmas partes bonitas e turísticas e que gostamos tanto de visitar. Porque é barato, e porque é o paraíso e porque as pessoas são acolhedoras.
E então o que é que nós fazemos? Nós, que temos dinheiro para viajar pelo mundo e comer camarão tigre à beira da piscina? Fechamos os olhos. Contentamo-nos em passar aquela semana no paraíso, confortados com a ideia de que estamos a levar o nosso dinheiro para um país que precisa dele. E ignoramos o resto. Ignoramos que famílias que precisam de alimentar os filhos estão reféns de grupos que lhes levam mais miséria disfarçada de oportunidade.
A incursão jihadista em Cabo Delgado começou em 2017. E quando é que demos por ela? Quando a Total se sentiu ameaçada. Quando os grandes grupos industriais que exploram os recursos do país enfrentaram o potencial interrompimento das suas actividades. Quando as decapitações começaram a ser notícia internacional porque já estavam na proximidade dos interesses internacionais.
Até agora podíamos todos ignorar a realidade. Porque não tinha grande impacto na nossa vida. Como sempre! Que ninguém se engane. Nascer num país com recursos, direitos humanos, dinheiro, é só um acaso. Ignorar outras partes do mundo que não têm essa sorte ou que estão do outro lado do espectro por pura coincidência ou por imposição histórica é criminoso.
Principalmente quando estamos a ignorar a ameaça jihadista.
Mais cedo ou mais tarde, o karma vai funcionar de forma espectuacular. E certamente, alguém se vai queixar que não foi avisado...
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