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Se alguém me contasse esta história, e não a tivéssemos vivido, eu achava que era tanga.
Não há como.
Em Fevereiro, a Turquia e a Síria foram assoladas por um tremendo sismo. As imagens da destruição entraram-nos pelas casas sem pedir licença, num tenebroso recordar de que a natureza é a dona disto tudo e que somos tão pequenos para lhe fazer face.
O que muitas pessoas ignoram é que esse sismo foi sentido em várias zonas do Líbano, incluindo na minha casa.
Era tarde, três, quatro, já não recordo. Estou deitada, mas acordada, a pensar se deveríamos fazer alguma coisa para comemorar o meu aniversário no dia seguinte. Afinal, já tenho "dentes", depois de um ano em cirurgias, já quase não sinto dores, é agora finalmente o momento de celebrar.
Começo a ouvir um ruído nas escadas. O meu marido ainda está a trabalhar na sala e pergunto-lhe o que se passa. "Está alguém com um escadote, estão a arranjar alguma coisa". Às três da manhã?! Levanto-me, mais para me queixar do que para confrontar o senhor da manutenção inoportuno e, assim que assento os pés no chão, não sinto a segurança habitual de um plano sólido. O chão está a abanar. É indescritível, a sensação. Suponho que como a ausência de gravidade, a subversão das regras da física.
Corro para a sala e também ele já está de pé. "O prédio está a abanar!", exclamo num grito contido. Abraçamo-nos debaixo do vão de uma porta, à espera, enquanto todo o prédio abana como um barco batido por vagas gigantescas. Pensamos os dois que é agora, vamos morrer ali, debaixo dos escombros de um prédio de doze andares.
Ao fim do que pareceu um eternidade, tudo pára. Já não há escadote (as coberturas de aço das zonas técnicas a abanar), já não há aquele ruído da terra a protestar, até as nossas respirações parecem pausar.
Estamos vivos. Devemos sair, para o caso de haver réplicas? Ouvimos vizinhos a descer as escadas, recusam-se a ficar dentro de portas. Pequenas coisas relembram-me a explosão do porto. Mas ficamos.
Estamos vivos. Mas tenho a sórdida sensação que este país, este mundo, me está a tentar matar. Já não tenho paciência.
Do tipo de tragédias como a que aconteceu em Itália, surgem sempre aquelas situações que a comunicação social em geral apelida de "milagres".
É o caso da jovem que esteve 42 horas debaixo dos escombros e foi resgatada com vida e é, especialmente, o caso da senhora de 98 anos que passou 30 horas isolada pela derrocada, em sua casa, a... tricotar.
A comunicação social chama-lhe milagre. Eu chamo-lhe comic relief.
Esta madrugada foi sentido um forte sismo em Itália, que atingiu os 6,3 graus na escala de Richter. Até agora há mais de trinta de mortos confirmados e várias dezenas de desaparecidos. Vejam a notícia em actualização aqui.
Estas situações vêm confirmar que os países europeus estão pouco preparados para enfrentar um desastre natural como um sismo. Os civis não sabem como se devem comportar: acorrem às ruas, onde se concentram, metem-se nos carros e entopem auto-estradas.
Portugal deve aprender com o exemplo italiano. Qualquer especialista nos dirá que já devia ter ocorrido o "big one" aqui no território, uma sequela do que aconteceu em 1755.
Por esta altura, já temos conhecimentos suficientes para minimizar as perdas e danos. Mas será que as pessoas têm esses conhecimentos presentes? Será que nos sabemos comportar em caso de sismo catastrófico?
O perigo, quer venha a materializar-se amanhã ou daqui a 100 anos, é real.
Opá, também quero ser um morto do sismo de Lisboa!
Vá, se não houver mais nada, um ferido também serve!
Um desalojado é que não! Que isso de só perder a casa num desastre natural de grandes dimensões é perfeitamente demodé!
O que me fazia mesmo feliz era participar do descarrilamento do Metro! Quiçá, ser empalada por uma daquelas barrinhas onde o pessoal se segura!
Mas uma pessoa nunca apanha gigs destes!
Queria mesmo ser figurante num sismo a brincar.
Mas onde é que uma pessoa se inscreve numa coisa destas, hum?
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